Como é o hambúrguer perfeito, segundo especialistas e amantes da boa comida
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Shadia Asencio - 2022-05-27T09:16:25Z
Partamos de uma realidade: não existe um hambúrguer ruim. Entre dois pães, qualquer ingrediente simples adquire um poder veemente, quase sobrenatural. E embora as opções possam ser infinitas, pessoalmente prefiro deixar a criatividade de lado quando se fala deles. Sim, as aberrações também são infinitas. O escritor culinário e amante empedernido de hambúrgueres, –como eu– Anthony Bourdain, dizia que eles já eram perfeitos, por que estragá-los?Em uma entrevista feita a Bourdain pelo TechInsider, o também cozinheiro compartilhou as oito regras de ouro para elaborá-los. O primeiro era mantê-los clássicos, quase acadêmicos: pão, carne, tomate, cebola, alface, picles e nada mais. Ricardo Campuzano, o chef do restaurante de hambúrgueres Margarita, afirma que o hambúrguer perfeito é resultado da simplicidade, mas também da qualidade dos ingredientes.O pão, claro, deve ser a moldura que engloba tudo. Um brioche macio e suficientemente amanteigado –é preciso ser conservador nas quantidades de nossa amiga láctea para evitar ofuscar o sabor da carne– consegue mandar um hambúrguer ao inferno do comum ou ao céu dos eleitos. Joan Bagur, padeiro e fundador de Sal e Doce Artesãos, resume que o pão ideal é um pão estilo brioche de manteiga com uma consistência que consiga sustentar o suco da carne. Isso sim, que também não seja muito grosso, pois poderia esconder o sabor do medalhão. “A manteiga com a qual se faz o pão deve ser de qualidade para que não nos deixe um gosto residual ruim”, completa. Falemos da carne. Se partirmos do princípio de que a origem da receita poderia ser das tribos mongóis e turcas do século XIV, que picavam a carne para torná-la pelo menos comestível, este ingrediente em versão moída ou triturada é insubstituível. Vamos lá. Se o retirarmos, melhor chamá-lo de sanduíche, bocata, entrepão, torta, emparedado. A decisão de elaborá-lo de carne bovina, de porco ou de uma combinação salomônica de ambas é uma questão de consciência, gosto e bolso. Bourdain afirmava que incluir sirloin ou algum corte muito exótico à mistura a destruía. Em vez disso, preferia o brisket ou a costela, algumas das partes mais gordurosas. E sim, a parte amarela, aquela que derrete com o calor, é o que realmente traz magia. O chef Campuzano assegura que a combinação perfeita é de 80% carne, 20% gordura, e apenas temperar com sal. Joan Bagur aconselha que deve-se cozinhar em uma chapa bem quente para que se selhe, caramelize e mantenha os sucos dentro. Recomenda finalizá-la na grelha para que adquira aquele sabor espetacular de assado. O escritor de Kitchen Confidential, Anthony Bourdain, afirmava que não poderia faltar o queijo e este deveria derreter. Panela, queijo cottage, queijo fresco, vocês não brincam. Na minha opinião, é através da combinação dos queijos, da gordura da carne e da manteigosidade do pão que a experiência chamada “hambúrguer” acontece. Que ninguém se esqueça dos molhos. Repousando no pão vai a maionese –um leve creme equilibrado em limão e gordura– e a rainha de todas, a ketchup (a ketchup ou o kétchup, para o restante da América Latina). Ela deve ser tomate e ácida, sutilmente doce para equilibrar a gordura e aportar acidez. Para Anthony não havia discussão sobre o bacon; sempre era a ocasião. Em contrapartida, achava um excesso quando os hambúrgueres chegavam à mesa como uma torre de Legos. O problema é que se for muito alta, é quase impossível reunir todos os seus sabores em uma mordida. Faltam apenas as batatas, porque, o que é um hambúrguer sem batatas? Citando Gloria Trevi, definitivamente é uma batata sem ketchup. Que sejam caseiras, cortadas em tiras ou em gomos. Que fiquem crocantes por fora, mas macias por dentro. De preferência, que não nos deixem os dedos engordurados, que não se empelotem.As aparências enganam. Os hambúrgueres podem parecer um alimento grosseiro, talvez porque os temos visto servidos em bandejas de plástico, entre plásticos e sacolas de papelão, em caixinhas de papelão para serem desfrutados no carro, com ou sem brinquedo. Isso não os torna menos bons. O hambúrguer é perfeito em seus componentes. Chegar a um equilíbrio é um acidente afortunado da Matrix; é a diferença entre uma comida rápida e uma refeição que mal se dilui na memória com o passar do tempo. Assim aconteceu comigo há uma semana no restaurante Nopa, em São Francisco, ou toda vez que me cruzo com um In and Out, onde seu molho laranja disfarça qualquer imperfeição, se é que existe. Também não esqueço os de The Spaniard, em Nova York. No México, há várias que piscam para mim. Aqueles que me lembram da minha adolescência, como os das Fontes de Satélite que levam abacaxi, ou os que costumava fazer Joan Bagur no OkDF e que acompanhava com batatas bravas. Recentemente experimentei o de Margarita, do chef Ricardo Campuzano, na colonia Narvarte: sua combinação de carne + bacon + cheddar me pareceu que ressaltava seus bons ingredientes de forma deliciosa. O hambúrguer é mais do que um sanduíche em esteroides. O ritual nos envolve, nos pede para ficarmos atentos para que a carne não desça ao fundo, para que os condimentos não terminem na roupa. Mas talvez a melhor parte de comê-lo seja que por quatro, quinze ou vinte mordidas que nos sobreviver, voltamos a ser crianças, crianças felizes novamente.