Ingredientes mexicanos ancestrais para evitar doenças
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Shadia Asencio - 2021-11-05T13:33:06Z
“Tudo cura e tudo sana”, assegura uma canção de tradição. A Terra inteira é medicina: cresce entre as milpas, abre caminho na imensidão das fontes hídricas, sopra no ar quente dos desertos, descansa na profundidade das planícies e das cavernas. Em plantas e árvores, o alimento se chama sol. É dele e do intrincado processo de fotossíntese que seus benefícios se vão tecendo entre as folhas, raízes, caules ou cascas.O primeiro registro da flora medicinal mexicana, o códice De la Cruz-Badiano, data de 1522. O compêndio detalhava o uso medicinal que os indígenas davam às ervas, seu saber transmitido ancestralmente e depois aplicado ao seu trabalho como curandeiros. A Comissão Nacional para o Conhecimento e Uso da Biodiversidade (CONABIO) assegura que das 4 mil espécies de plantas das quais se tem registro no território nacional, pelo menos 3 mil poderiam ter efeitos medicinais. Não há dúvida de que são elas quem, antes da medicina ocidental, curaram e salvaram os nossos. A avó de tradição tolteca e autora do livro Sou mulher medicina, Eva Cecilia Solís Arroyo, me explicou em entrevista que uma das curas pré-hispânicas mais importantes foi o temazcal – um ritual cerimonial no qual pedras quentes são pulverizadas com água e adicionadas com ervas medicinais. Graças a ele, nossos ancestrais permaneciam saudáveis. Embora pareça, a medicina tradicional não está em esquecimento. Culturas mãe como a chinesa e a indiana incluíram os saberes da fitoterapia nos planos de saúde governamentais estendidos entre a população. Segundo comenta a avó, no México os povos indígenas originários continuam combinando a medicina tradicional com a alopática. “O mundo vegetal está a nosso serviço, é por isso que podemos dar uma intenção de cura a cada planta”, assegura. Além disso, nos explica que, assim como no Ayurveda, cada planta possui um espírito com uma vibração ou força particular: a ardente e a sutil, a masculina e a feminina. “As primeiras são plantas de vibração forte. As usamos em círculos de proteção, purificações, limpezas energéticas, etcétera… As femininas são as que se utilizam para atrair a beleza, as que usamos nas cremes para o rejuvenescimento, para curar”, conclui a avó. Para extrair a essência da planta, realizam-se técnicas específicas como vaporização, infusões, destilados e cozimentos com os quais se criam chás, ungüentos, águas de uso, emplastros, compressas, macerações, lavagens e banhos, tinturas e cataplasmas. No entanto, ao simplesmente incluí-las cruas ou cozidas nos alimentos do dia a dia, elas nos oferecem todos os seus benefícios. Os ingredientes mexicanos favoritos da avó medicinaNa botica do lar não podem faltar as gotinhas de mel melipona, provenientes de uma abelha sem ferrão, fundamentais para as civilizações maias. Xamãs e curandeiros de todas as épocas a utilizaram como expectorante, cicatrizante, antisséptico natural e contra doenças dos olhos e ouvidos. O momo ou folha santa, por sua vez, constitui o aroma e o sabor de um sem-fim de guisados no sudoeste do país. O nome místico desta planta não é casualidade: é o resultado de seu grande poder curador. Tem sido amplamente usado como digestivo, pois ajuda no funcionamento intestinal correto e diminui a dor abdominal; reduz a febre, alivia a insônia e relaxa os nervos.O muicle, que cresce nos trópicos mexicanos, é eficaz para limpar o sangue, desintoxicar o corpo. Para os mixes zapotecos e totonacos cura o empacho e, em recentes pesquisas, foi comprovado seu poder antidepressivo. A casca de cuachalalate, nativa do sul nacional, é fervida em água para tratar o câncer, prevenir o linfoma, ajudar em problemas gástricos e de matriz, assim como desinflamar o organismo. A chaya, também de origem mexicana, é usada para tratar a diabetes, para reduzir peso e para prevenir a desmineralização em crianças e adultos.Para a avó, o epazote não falta em sua panela de cozimento por seu sabor e suas propriedades antibióticas, bactericidas e inseticidas. “Deve-se tomá-lo quando há vômito, inflamação, coceira e até para ajudar a expulsar a placenta após a concepção”.Embora não sejam mexicanas, a avó assegura que as buganvílias são um ótimo expectorante para a bronquite, por isso as inclui em seus temazcais e até cruas, nas saladas. O alho é outro de seus favoritos porque “é desinfetante, antiparasitário e diurético”, enquanto o louros o prepara em chás para promover o apetite nas crianças. “Temos que ter consciência de que o reino vegetal é um ser vivo. Devemos voltar a nos conectar com os alimentos e as plantas que utilizamos ao cozinhar. Ao estarem vivos, recebem a intenção e a energia que nós lhes impusermos. O convite é para reconectar com o que nos alimenta, para fazer da comida nossa medicina”, finaliza a avó Eva.