Nessa manhã, caminhamos pelas áridas ruas da capital de Veracruz. O ambiente já não cheirava mais a mar, ou sim, mas de longe. Erik Guerrero e eu esperamos na mesinha de chapa que tinha o logo de uma cerveja como toalha. A promessa eram os frutos do mar que, segundo um dos chefs mais importantes do porto e fundador do Nossa Pesca, não tinham concorrência. “Aqui vem até Enrique Olvera”, me garantiu. Após quinze minutos, saiu da cozinha de Ay Apá uma tigela de barro grosso e fumegante com arroz à tumbada. A cada mexida da colher, saíam as batatas e os frutos do mar suspensos naquela espécie de oceano vermelho com aromas de epazote.
Lembro que, após a queimadura na língua, o caldo me deu informações sobre o sabor do mar, sobre a justiça que uma boa preparação faz aos seus frutos. Essa não foi a única vez. Essa sensação veio com os coquetéis de polvo que me apresentou Jonatán Gómez Luna em Tulum, ou as amêijoas chinesas que o chef Nico Mejía nos deixou provar na lagoa de Cuyutlán, Colima. Anos antes, também a senti frente à Quebrada em Acapulco. Não tinha nem quatro anos quando soube que os frutos do mar do México são para fazer um poema em endecasílabos.
Os 1.592,77 km² que mede o litoral mexicano são espaço suficiente para fazer uma festa interminável de pratos regionais que combinam os frutos do mar de formas únicas. O norteño, o costeño ou o chilango sabe que uma taça bombacha transbordando de camarões ou uma mesa de plástico com molhos vinagretes no centro, são a ante-sala de um prazer reservado para os não novatos, para aqueles que conhecem a gastronomia nacional desde suas profundezas.
É preciso sentir-se plenamente mexicano e à vontade para arriscar a vida em uma barraca de frutos do mar em frente ao metrô na Cidade do México – e ainda assim é provável que a descoberta seja bem-sucedida. E se isso acontece no centro do país, a quilômetros do mar, a viagem pelos dois flancos das costas mexicanas merece apertar os cintos para depois desapertá-los.
A primeira parada seria em Mazatlán, onde deve-se pedir um burrito de marlín recheado com feijão em frente a um quiosque de praia. Em Tampico, a viagem se torna curta quando há no meio algumas caranguejos recheados de Los Curricanes, que podem ser levados como souvenir em sua versão congelada e devidamente guardada em uma caixa térmica.
Os aguachiles verdes do norte despertam o suor e a vontade de apagá-lo à força de cervejas tão geladas quanto as correntes de Humboldt, enquanto os negros de Yucatán nos cativam com os sabores acinzentados de seu recado. Alguém quer ceviches? Há tanta variedade quanto cozinhas tradicionais. Já sabem, não é a mesma coisa o ceviche de Nayarit que um de Jalisco ou de Guerrero. Um mole vermelho com camarões? É preciso tocar base no istmo oaxaqueño.
De ostras as de Sonora, e é melhor que tenham queijo parmesão. A Rosarito deve-se chegar pelas lagostas ao vapor que depois são fritas e envolvidas em tortillas de farinha recém-feitas. Feijõezinhos, molhinho e manteiga, ¡pum! Direto para o mar, e também para o céu. Daí, por amêijoas chocolatas a La Paz ou por todo tipo de conchas na Baja: sobre umas suculentas tostadas, à Guerrerense; sobre pratos com toques Baja-Med e técnicas limpas em Fauna, Deckman’s ou Villa Torél.
Erik Guerrero diz que o mais gostoso do Golfo é seu peixe, e do Pacífico, frutos do mar como camarão, conchas, polvo, caracol, lulas e lagostas. Ele nos convida a nos aventurarmos fora do porto para ir em busca de uma recompensa única: os frutos do mar de Doña Tella em Alvarado. Suspeito que vou lhe dar ouvidos. Depois de sua recomendação de Ay Apá, eu acreditaria que a lua é de Veracruz.
Se você não pode viajar este ano, não tem problema.
A Quaresma já começou, e com ela uma temporada gastronômica na qual não podem faltar as preparações frescas, as receitas apimentadas e os frutos do mar que te levarão às praias mexicanas em um par de ingredientes. Pronto para o tour?